O governo federal vem flertando com ideias de aumentar o tamanho do Estado na economia por meio de reestatizações, uso da Petrobras na política econômica e indicações políticas para administração de empresas. Na noite de quarta-feira, em entrevista à jornalista Míriam Leitão, o vice-presidente e ministro do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC), Geraldo Alckmin, desenhou o cenário oposto: disse que “não vai ter nenhuma reestatização” e “não tem governo empresário, não tem TJLP”.
Alckmin vem sendo um canal da indústria quando o assunto é energia para competitividade do setor produtivo, quando o Ministério de Minas e Energia (MME) tardou em se posicionar – como na tentativa do Congresso em incluir térmicas a gás natural em projeto de lei das eólicas offshore. Porém, a fala de Alckmin parece estar em descompasso com o pensamento do Palácio do Planalto e seus órgãos.
Ontem foi publicada portaria da Secretaria-Geral da Presidência da República que cria Grupo de Trabalho para “acolher e sistematizar percepções e propostas da sociedade civil relacionadas aos processos recentes de desestatizações no setor elétrico e suas consequências”. A portaria diz que o grupo será coordenado pela Secretaria Nacional de Diálogos Sociais e Articulação de Políticas Públicas, que convidará participantes ao grupo, indicados pelo ministro Márcio Macêdo (deputado licenciado do PT-SE).
O MME e os principais entes do setor, como o Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS) e a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) não são mencionados na portaria, que menciona que poderá convidar para as reuniões semanais “organizações da sociedade civil, movimentos sociais”. Em 120 dias, Macêdo deverá receber estudo feito pelo grupo.
Grupos de Trabalho, muitas vezes, não redundam em ações concretas, mas a iniciativa do ministro, que pode deixar o governo para ser candidato a prefeito de Aracaju pelo PT, é mais uma jogada do Palácio do Planalto para tentar delimitar ações de empresas desestatizadas – e com as quais o governo, muitas vezes, não concorda
Outro movimento palaciano que indica o apetite por um Estado mais prevalente nas empresas é o projeto de lei de renovação das concessões das distribuidoras, que pode ter nascido com ajuda da Casa Civil. O projeto determina que governos indicarão membros aos conselhos de administração das distribuidoras, reduz o mercado livre de energia e a expansão da geração distribuída, coloca todos os custos por gatos de eletricidade sob responsabilidade das distribuidoras, retira tributos da energia para baixa renda e aloca todo o custo do risco hidrológico para as geradoras e distribuidoras. É quase uma minirreforma do setor, pelo avesso, causando terror no setor, que avalia falta de gestão e comando técnico.
Esses recentes movimentos que indicam maior espaço do governo na economia via estatais se somam às declarações do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e do ministro do MME, Alexandre Silveira, questionando a diluição do governo no capital da Eletrobras e a atuação de seus acionistas; somam-se também às tentativas de reestatizar refinarias vendidas pela Petrobras, de indicar presidente para a Vale, de antecipar fundos da Eletrobras para reduzir a tarifa de eletricidade, entre diversos movimentos.
Fica uma sensação de déjà-vu da Medida Provisória 579/2012, que visava reduzir a conta de luz e causou uma judicialização sem fim no setor elétrico. Ao flertar com o gigantismo estatal, o governo coloca em risco a tão afamada segurança jurídica brasileira e o respeito aos contratos, que mantêm o Brasil na rota de investimentos. Importante lembrar: a matriz energética limpa e renovável vale menos quando o risco geral sobe.
Flávia Pierry – Direto de São Paulo
Chico de Gois – Direto de Brasília
Foto: Fabio Rodrigues Pozzebom