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Endereço imperdível: Petí Gastronomia

Este achado na Zona Oeste paulistana transforma um curso de três tempos numa experiência única.

Por: Edson Rossi

Avaliar um restaurante envolve três coisas. O ambiente. O serviço. E a comida. Evidentemente, cada pessoa, dependendo de cada momento, vai focar mais e dar maior peso a um desses três segmentos. Isso vale para aquele lugar em que a história-antiguidade, ou a atmosfera, ou os móveis, ou a vista ou os frequentadores compensarão o programa. Há outros em que o atendimento vai beirar a perfeição. Se mostrará atento, educado, solícito e não invasivo. Nem cometerá o maior dos crimes: ser apressado ou vendedor, empurrando coisas como se estivesse numa loja popular em promoção. O melhor ambiente e o melhor serviço, no entanto, não vão sobreviver ao terceiro ponto. P-o-n-t-o-c-r-u-c-i-a-l. A comida. E aqui é preciso aprender uma regra sagrada. Com ingrediente bom até se faz comida ruim, mas com ingrediente ruim jamais se faz comida boa. Por esse motivo, a cada quatro reportagens trarei neste site uma matéria que chamarei de ‘Lugar Imperdível’. Um endereço que vale a pena conhecer. Acima de tudo, pelo que sai da cozinha. Para estrear este espaço, falarei do paulistano Petí Gastronomia. Um Bib Gourmand.

Antes de tratar do Petí (com acento no í mesmo), vale reforçar do que se trata um Bib Gourmand, a honraria não estrelada dentro do Guia Michelin. Criada em 1997, a distinção “reconhece estabelecimentos agradáveis que servem boa comida a preços moderados”. Em suma, o nosso tão amado ‘bom-e-barato’. Para criar a categoria, o Michelin aproveitou o fato de que seus inspetores (sempre anônimos na hora de consumir e gente conhecedora de restaurantes sofisticados em todo o mundo) identificavam muito bem os endereços que oferecem comida de alta qualidade a preços acessíveis. “Essas observações acumuladas resultaram na criação” do Bib Gourmand – cuja imagem é o Bibendum, boneco-símbolo da Michelin, lambendo os lábios. Para muitos, e eu me encaixo na lista, a criação da categoria promoveu uma explosão de restaurantes que são despretensiosos (mas não desatentos) no ambiente e no serviço, e focam em ingredientes e técnicas para uma experiência gastronômica rica. Saem de cena o cristal, a toalha e o guardanapo de algodão ou linho. Sai de cena a ilimitada brigada de salão. Tudo para jogar o foco na cozinha. No Brasil, há 34 postos assim. E 28 ficam em São Paulo. Um deles, o Petí.

Amo este lugar. Aberto em 2015 numa espécie de quintal dos fundos da loja Pintar, de materiais de desenho & pintura, na rua Cotoxó (nº 110), no bairro de Pompeia, em São Paulo, o Petí Gastronomia tem zero indicadores que remetam a um grande restaurante. Mas é o que ele é. Fica numa parte do bairro a poucos quarteirões do estádio do Palmeiras, num pedaço bem residencial, de prédios menores e sem ostentação (apesar de duas obras próximas indicarem que isso mudará em breve, eu diria). Alguém desavisado passará pela frente da Pintar/Petí sem notar sua entrada. Para os afortunados, basta entrar pela porta da loja, atravessar as estantes (repletas de lápis, folhas, telas, tintas, cadernos, guaches, pincéis…) e descer alguns degraus para chegar a esse microparaíso de apenas 42 lugares, com mesas que ocupam o corredor em formato de L. Abre apenas nos almoços. Terça a sexta (12:00-15:00) e sábados, domingos e feriados (12:00-16:00), sendo que no último domingo de cada mês ele fecha.

Victor Dimitrow, o chef, é filho dos donos da loja de pintura em que montou seu restaurante. Toca o Petí com sua companheira Bárbara Camargo e uma brigada enxuta e competentíssima, seja cozinha ou salão. Ele se formou em gastronomia e trabalhou fora do Brasil. De um desses lugares, o parisiense Le Chateaubriand, trouxe seu DNA. O icônico endereço francês é tido como o papa do movimento conhecido como ‘Bistronomie’ – em essência, uma nova geração de chefs que abriu mão de serviço rigoroso e mesas engomadas (e caras, porque mandar lavar aquilo a toda hora custa uma bala) em nome de um atendimento mais descontraído (mas não displicente) com alta cozinha, excelentes e selecionados ingredientes e preços mais próximos de seres humanos normais.

O que Victor faz, e na maioria das vezes é o que acontece entre os classificados como Bib Gourmand, é ‘Bistronomie’. No caso dele, de forma impecável. Seu menu muda a cada 15 dias. São três opções de entrada (R$ 25 cada), três de pratos (RS$ 65 a R$ 75, sendo um vegetariano sempre) e duas de doces (R$ 25 cada). Vá de menu completo. Escolha uma opção de cada (entrada-prato-sobremesa) por R$ 85 a R$ 95. Vale muito a pena. Na parte de bebidas, há excelentes drinques (a partir de R$ 30). E vinhos (entre R$ 130 e R$ 195; taças a R$ 30; taxa de rolha por R$ 70). Quase sempre vou de Guatambu Extra Brut. Mas é na comida que Victor e seu time mostram todo o talento e vigor. Eu acredito ter ido ao Petí dezenas de vezes. Mais de 50 facilmente. E nunca (n-u-n-c-a) deixei de sair surpreendido.

Na primeira quinzena de dezembro-2023 uma das entradas era guioza suíno com nirá, ponzu de tucupi, compota de berinjela com especiarias, salada de ervas e crocante de berinjela defumada. Sim. Uma sinfonia de sabores conjugados como numa partitura. De prato principal havia, entre as opções, lasanha de ragout de costela com fonduta de queijos brasileiros, pesto de manjericão, cavolo nero tostado e molho roti. Muito sai da horta que eles mantêm local. Chamarei tudo de a Santíssima Trindade de qualquer ofício. Técnica. Estética. Ética, Técnica porque Victor Dimitrow é um pesquisador e abusa de ingredientes muitas vezes renegados na cozinha brasileira. Faz isso para transformá-los em protagonistas. Isso é técnica (pesquisa), mas também é ética (o resgate). E a apresentação de seus pratos é a de um artista. Lindos, coloridos, fascinantes. Nunca menos que obras-primas, fazendo jus à loja de materiais de pintura que abriga o restaurante – visite o Instagram do Petí e você vai entender do que falo. Essa combinação de pratos de técnica irretocável (cocção, temperatura, textura, sabor), de estética irretocável (são tão lindos quanto saborosos) desdobra em ética. Inclusive, nos fazendo pensar no quanto a cozinha é um resgate de alimentos e de suas combinações, sem desperdícios em nome de prazeres. Prazeres que chegam em outro patamar. Conheci o Petí tendo a recomendação de dois outros chefs que admiro demais: Viviane Gonçalves (Chef Vivi & Hotel Emiliano) e Ivan Ralston (Tuju). Se eles disseram sim… Acredite. É sim!

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